Letícia Daniela da Silva Cabral 3º ano A EM
Escola
SESI de Salto – CE125
III Eixo
Integrador Ciências Humanas
De olho
no futuro
Crônica
Maria
acorda com o agonizante despertar de seu relógio de cabeceira, suspira, em
desespero, mesmo antes de abrir os olhos. Sua mente traça planos, relembra as
tarefas de que devem ser cumpridas sem falta. Antes de impulsionar o próprio
corpo, para se levantar, ela pede forças, para quem, exatamente, não fazia
ideia.
Maria era
uma mulher comum, assim como seu nome já nos revela. Sofria dos mesmíssimos
males de que todos os seres humanos estão propensos a sofrer: doenças, cansaço,
tristezas, complicações financeiras.
Arrumou-se
com pressa, assim como executava todas as tarefas de sua vida. Saiu de seu
quarto, evitando olhar para a porta do cômodo ao lado, trancada, aprisionando
as lembranças, poupando-a de mais sofrimento. Aquele era o quarto de seu filho.
Quero dizer, seria se ela não o tivesse perdido. "O estresse, Maria, é o
inimigo de toda e qualquer forma de vida" disse o Doutor ao tentar
explicar de forma quase eufêmica o aborto espontâneo, como se não sofresse
também com o estresse. Ela olhava para a grande falta de cabelo em um homem tão
jovem...
O café
coado na noite passada, estava amargo, Maria o engolia, pesarosamente, tentando
se distrair assistindo a televisão. O canal de notícias reportava todos os
tipos de crimes cometidos por indivíduos gananciosos, injustos ou simplesmente
necessitados. Os demais canais digladiavam-se, para ver qual conseguia
passar o maior número de comerciais, com incentivo ao consumo, em menor tempo. Já
na primeira refeição, Maria ingere uma boa dose de café amargo e estímulo ao
consumismo. Seu relógio apita, hora de sair de casa. Todas as horas de seu dia
eram destinadas a alguma tarefa, que Maria não tinha o menor prazer de
realizar. Saiu de casa, pegando o ônibus que, por sorte, parava em frente à
empresa onde, por sorte, trabalhava. Não que fosse um cargo alto, bem remunerado.
Mas Maria era uma mulher. Não devia estar feliz por estar trabalhando? Não
interessa se seu salário represente um terço dos salários dos funcionários
homens no mesmíssimo cargo.
Ser
esmagada no ônibus já não era novidade, com a bolsa colada ao seu corpo, Maria
observa as ruas correrem aos arredores do veículo. Os outdoors expondo mulheres
com corpos irreais e objetos de preços exorbitantes. Tudo inatingível para
meros mortais como Maria, para a multidão de pessoas comuns, que é induzida a
pensar da mesma forma e a sonhar os sonhos, que sequer são autenticamente seus.
Marionetes do sistema vigente injusto e corrupto. Quem está pelos pobres? Onde
está você, Robin Hood Moderno, para os acudir, quando todos os heróis são, na
verdade, vilões mascarados, hipócritas e mentirosos?
O ônibus
para com um forte solavanco, sacudindo Maria para fora de seus pensamentos.
Maria desce, e sua rotina mecânica de trabalho se inicia: montanhas de papéis e
números inacabáveis, ela sentia-se o próprio Charles Chaplin em “Tempos
Modernos”, ao digitar infinitamente no teclado de seu computador. Ah, a sociedade
pós-moderna... Sempre entubada em seus cabos de internet e computadores,
respirando através de softwares. O dia arrasta-se, levando consigo o restante
de vitalidade dos corpos dos trabalhadores. O retorno para as casas, após dez
horas vendidas em troca de salários medíocres, para viver um estilo desigual e
insensível. Horas utilizadas para enriquecer ainda mais a burguesia, que suga
as almas do proletariado. O mostro da desigualdade sempre foi robusto,
impossível de não se notar. Mas o que meros mortais podem fazer, quando até os heróis
estão do outro lado? “Maria, tente ver a vida pelo lado bom.” Seu antigo
psicólogo costumava dizer. Exausta, Maria chega em casa e desaba em seu velho
sofá, relembrando as palavras do doutor, das quais discordava plenamente.
- Se há
ambas visões de mundo, porque não enxergar com olhos frios a realidade? –
Balbucia consigo mesmo, mudando os canais da televisão, repletos de asneiras. –
A ingenuidade do otimismo apenas nos afoga em falsas esperanças. - E fecha os
olhos, entregando-se ao cansaço. Seu corpo desaba, mas sua mente continua em
ritmo máximo. Haviam tantas coisas para serem feitas amanhã... Nada havia
valido à pena, pois na manhã seguinte, como Sísifo, retornaria à sua
condenação.
Excelente abordagem sociológica acerca dos sonhos e condições de vida do trabalhador. Como não se orgulhar de ler algo tão bem elaborado?
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